Além de prever que o aumento da temperatura global nas próximas décadas pode chegar a 1,5 grau Celsius já na próxima década — patamar considerado derradeiro para evitar um cataclisma —, o relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) lançado nesta segunda traça cinco cenários possíveis para o futuro.
Os panoramas são resultado de cálculos complexos que dependem do quão rápido a Humanidade reduzirá as emissões de emissões de gases causadores do efeito estufa. Também buscam capturar mudanças socioeconômicas que levem em conta fatores como variações populacionais, densidade urbana, educação, exploração de terra e riqueza.
Por exemplo, um aumento populacional deverá aumentar a demanda por combustíveis fósseis e água. A maior escolaridade, por sua vez, pode afetar a velocidade dos desenvolvimentos tecnológicos. Já as emissões evidentemente aumentam quando há o desmatamento de áreas florestais.
Os cenários indicam tanto os níveis de emissão quanto o “Caminho Socioeconômico Compartilhado” (SSP, na sigla em inglês) utilizado para calculá-lo. Em todos eles, a marca de 1,5 grau Celsius deverá ser ultrapassada entre 2021 e 2040, embora a probabilidade dessa ultrapassagem seja maior nos cenários de mais alta emissão.
Mais otimista
O melhor dos cenários, nomeado de SSP1-1.9 — o 1, uma referência à qualidade dos fatores socieconômicos, e o 1,9, ao saldo de energia acumulada na atmosfera em Watts/m2 até 2100 — descreve um cenário em que as emissões de carbono serão neutralizadas por volta da metade do século.
As sociedades farão a transição para práticas mais sustentáveis, mudando seu foco do crescimento econômico para o bem-estar. Os investimentos em educação e saúde aumentarão, enquanto a desigualdade cairá. Eventos climáticos extremos serão mais comuns, mas o mundo terá driblado seus piores impactos.
Apenas este panorama permite manter o aumento de temperatura ao redor de 1,5 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, como consta no objetivo traçado durante o Acordo de Paris, em 2015. É “muito provável” que o aquecimento bata a marca cataclísmica a curto (2021-2040) e médio prazo (2041-2060), mas retroceda até o fim do século, se estabilizando ao redor de 1,4 graus Celsius.
Otimista
No segundo melhor cenário apresentado pelo IPCC, o SSP1-2.6, as emissões globais de carbono são maciçamente reduzidas, mas não tão rápido quando no panorama anterior, atingindo a neutralidade após 2050. Ele leva em conta as mesmas mudanças socioeconômicas em direção à sustentabilidade que o anterior, mas o aumento da temperatura, até o fim deste século, ficaria ao redor de 1,8 graus Celsius.
Nesta projeção, há “muita confiança” que o número anual de dias com temperaturas superiores a 35 graus Celsius na Amazônia aumentaria cerca de 60 dias, o que teria consequências gravíssimas para o ecossistema. O aquecimento dos oceanos neste século, por sua vez, poderia ser duas vezes maior que o observado entre 1971 e 2018.
Intermediário
No cenário intermediário, o SSP2-4.5, as emissões de CO2 ficam ao redor dos níveis atuais até começarem a cair no meio do século. Não atingiriam, contudo, a neutralidade até 2100.
No SSP2-4.5, os fatores socioeconômicos seguem suas tendências históricas, sem mudanças notáveis, e os avanços em direção a um mundo mais sustentável são lentos, com a renda e o desenvolvimento crescendo em ritmos desiguais. Caso esta previsão se confirme, o IPPC estima que haja um aumento entre 2,1 e 3,5 graus Celsius até o fim deste século, sendo o mais provável ao redor de 2,7 graus Celsius.
A última vez que a temperatura da superfície continental, mais quente do que a marinha, esteve mais de 2,5 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais, que levam em conta o período entre 1850-1900, foi há 3 milhões de anos, apontam os cientistas com grau médio de confiança.
Pessimista
Neste panorama, o SSP3-7, as temperaturas aumentam constantemente e o nível atual de emissões praticamente dobra até 2100. Os países tornam-se mais competitivos entre si, mudando seu foco para a Segurança Nacional e para garantir seus próprios estoques de comida. Até o fim do século, estima-se que o planeta tenha aquecido 3,6 graus Celsius com relação aos níveis pré-industriais.
Com isso, o IPCC projeta que as tempestades de verão no Hemisfério Sul se agravem e que o Ártico fique praticamente sem gelo durante os meses de verão, entre outras catástrofes.
Mais pessimista
O SSP5-8.5, pior dos cenários, deve ser evitado a qualquer custo. Nele, o nível de emissões atuais dobraria até 2050. A economia global cresceria, mas às custas da exploração de combustíveis fósseis e de estilos de vida que gastam muita energia.
Até o fim do século, o mais provável é que a temperatura global aumente ao redor de 4,4 graus Celsius. Cada meio grau a mais de aquecimento, destaca o Observatório do Clima, aumenta a frequência de ondas de calor, tempestades e secas que afetam a agricultura.
Neste panorama, o aquecimento dos oceanos poderia ser oito vezes maior que o observado entre 1971 e 2018, enquanto a elevação total das marés, até o fim do século, pode ser de 63 cm a 1,02 metros. Os picos de maré alta que ocorriam uma vez a cada século poderão agora ser eventos anuais, diversas cidades costeiras, como o Rio, ficariam inundadas e países insulares ficariam inabitáveis. Na Amazônia, o número de dias por ano com temperaturas acima de 35 graus Celsius pode aumentar em mais de 150.
Incógnitas
O relatório não é capaz de dizer qual cenário é o mais provável, já que leva em conta uma série de variantes que passam por fatores como ações governamentais. Ainda assim, em todos eles, o aquecimento global continuaria por ao menos mais algumas décadas, os níveis dos oceanos continuarão a subir por centenas ou milhares de anos e o Ártico ficará praticamente sem gelo em ao menos um verão nos próximos 30 anos.
A velocidade das mudanças e o seu grau de perigo, contudo, dependerão das ações humanas para mitigar o aquecimento do planeta.
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